terça-feira, 1 de maio de 2012

Jeito: Uma Palavra Muito Usada no Português Brasileiro

A palavra "jeito" sozinha significa maneira, mas ela também pode ser usada de mil jeitos, e vai ter um significado diferente, dependendo da expressão e do contexto em que estiver inserida.
Confira abaixo algumas delas:



Fazer algo com Jeito: com habilidade
É preciso saber dar injeção com jeito, se não, dói muito!
Este trabalho é muito complicado, é preciso fazê-lo com jeitinho!

 Dar um Jeito: encontrar uma solução
Tenho muitas dívidas para pagar e estou sem dinheiro! Vou ter que me virar, dar um jeito!
Como não tinha farinha, eu dei um jeito e fiz o bolo com maizena.

Dar Um jeito em: consertar, arrumar
Hoje vou dar um jeito no meu cabelo: retocar raiz, alisar e fazer chapinha
Este menino está mal criado, preciso dar um jeito nele.

Levar Jeito Para: ter aptidão
Aline leva jeito para ser professora.
Eu não levo jeito para ser tia!

Mal Jeito: torcer, machucar
Dei uma mal jeito no meu pé e ele está doendo muito.
Meu pescoço está doendo porque dormi de mal jeito.

Ficar Sem Jeito: ficar com vergonha
Ana ficou sem jeito na apresentação, eram muitas pessoas olhando para ela.
Sempre fico sem jeito quando tenho que falar em público.




Colocação Pronominal

Você já ouviu alguém falando para um amigo: "Convidá-lo-ei para a minha festinha no próximo sábado"???? Se ouviu deve ter ficado surpreso... E não é para menos, a colocação pronominal é algo muito debatido no português brasileiro. E aí vem a dúvida, quando usar ênclise, próclise, mesóclise? O que é isso??? Não se assuste, em primeiro lugar vem o bom senso, lembre-se que um bom falante (em qualquer língua) é aquele que sabe se adequar ao contexto.
Na língua falada, o pronome sempre antes, e quando são dois verbos, o pronome deve vir sempre no meio. Na escrita, se não é algo muito formal, lembre-se de nunca começar frases com pronomes e colocá-lo sempre depois de locuções com verbos no infinitivo.
Vejamos o que Luís Fernando Veríssimo nos diz sobre isso.

Antes de apresentar o Carlinhos para a turma, Carolina pediu:
— Me faz um favor?
—O quê?
— Você não vai ficar chateado?
—O que é?
— Não fala tão certo?
— Como assim?
— Você fala certo demais. Fica esquisito.
—Por quê?
— É que a turma repara. Sei lá, parece…
— Soberba?
— Olha aí, ‘soberba’. Se você falar ‘soberba’ ninguém vai saber o que é. Não fala ‘soberba’. Nem ‘todavia’. Nem ‘outrossim’. E cuidado com os pronomes.
— Os pronomes? Não posso usá-los corretamente?
— Está vendo? Usar eles. Usar eles!
O Carlinhos ficou tão chateado que, junto com a turma, não falou nem certo nem errado. Não falou nada. Até comentaram:
— O Carol, teu namorado é mudo?
Ele ia dizer ‘Não, é que, falando, sentir-me-ia vexado’, mas se conteve a tempo. Depois, quando estavam sozinhos, a Carolina agradeceu, com aquela voz que ele gostava:
— Comigo você pode botar os pronomes onde quiser, Carlinhos.
Aquela voz de cobertura de caramelo.
(VERISSIMO, Luis Fernando. Contos de verão. O Estado de S. Paulo, 16 jan. 2000.)

Os Jornais - Rubem Braga


OS JORNAIS - Rubem Braga


Meu amigo lança fora, alegremente, o jornal que está lendo e diz:
- Chega! Houve um desastre de trem na França, um acidente de mina na Inglaterra, um surto de peste na Índia. Você acredita nisso que os jornais dizem? Será o mundo assim, uma bola confusa, onde acontecem unicamente desastres e desagraças? Não! Os jornais é que falsificam a imagem do mundo. Veja por exemplo aqui: em um subúrbio, um sapateiro matou a mulher que o traía. Eu não afirmo que isso seja mentira. Mas acontece que o jornal escolhe os fatos que noticia. O jornal quer fatos que sejam notícias, que tenha conteúdo jornalístico. Vejamos a história desse crime "Durante os três primeiros anos o casal viveu imensamente feliz..." Você sabia disso? O jornal nunca publica uma nota assim:
"Anteotem, cerca de 21 horas, na rua Arlinda, no Méier, o sapateiro Augusto Ramos, de 28 anos, casado com a senhora Deolinda Brito Ramos, 23 anos de idade, aproveitou-se de um momento em que sua consorte erguia os braços para segurar uma lâmpada para abraçá-la alegremente, dando-lhe beijos na garganta e na face, culminando em um beijo na orelha esquerda. Em vista disso, a senhora em questão voltou-se para o seu marido, beijando-o longamente na boca e murmurando as seguintes palavras: "Meu amor", ao que ele retorquiu: "Deolinda".
Na manhã seguinte Augusto Ramos foi visto saindo de sua residência às 7:45 da manhã, isto é, dez minutos mais tarde do que o habitual, pois se demorou, a pedido de sua esposa, para consertar a gaiola de um canário-da-terra de propriedade do casal".
A impressão que a gente tem, lendo os jornais - continuou meu amigo - é que "lar" é um local destinado principalmente, à pratica de "uxoricídio". E dos bares, nem se fala. Imagine isto:
"Ontem, certa de 10 horas da noite, o indivíduo Ananias Fonseca, de 28 anos, pedreiro, residente à rua Chiquinha, sem número, no Encantado, entrou no bar "Flor Mineira", à rua Cruzeiro, 524, em companhia de seu colega Pedro Amância de Araújo, residente no mesmo endereço. Ambos entregaram-se a fartas libações alcoólicas e já se dispunham a deixar o botequim quando apareceu Joca de tal, de residência ignorada, antigo conhecido dos dois pedreiros, e que também estava visivelmente alcoolizado. Dirigindo-se aos dois amigos, Joca manifestou desejo de sentar-se à sua mesa, no que foi atendido. Passou então a pedir rodadas de conhaque, sendo servido pelo empregado do botequim, Joaquim Nunes. Depois de várias rodadas, Joca declarou que pagaria toda a despesa. Ananias e Pedro protestaram, alegando que eles já estavam na mesa antes. Joca, entretanto insistiu, seguindo-se uma disputa entre os três homens, que terminou com a intervenção do referido empregado, que aceitou a nota que Joca lhe estendia. No momento em que trouxe o troco, o garçom recebeu uma boa gorjeta, pelo que ficou contentíssimo, o mesmo acontecendo aos três amigos que se retiraram do bar alegremente, cantarolando sambas. Reina a maior paz no subúrbio Encantado, e a noite bastante fresca, tendo dona Maria, sogra do comerciante Adalberto Ferreira, residente à rua Benedito, 14, senhora que sempre foi muito friorenta, chegando a puxar o cobertor, tendo depois sonhado que seu netinho lhe oferecia um pedaço de goiabada".
E meu amigo:
- Se um repórter redigir essas duas notas e levá-las a um secretário de redação, será chamado de louco. Porque os jornais noticiaram tudo, tudo, menos, uma coisa tão banal de que ninguém se lembra: a vida...